Olá, obrigada por estar aqui novamente, lendo sobre nossa história.
Hoje vou falar da fase de luto que as famílias passam ao receberem o diagnóstico ou quando há a possibilidade dele, seja de autismo, ou de qualquer outro transtorno, síndrome, deficiência, que é uma fase bem difícil e que muita gente não entende, ou não sabe entender, pois nunca passou por uma situação semelhante.
Para quem já leu o post anterior, "Marcos do desenvolvimento infantil, cada criança tem seu tempo?", se não leu clique aqui, soube que desde bebê o meu filho já apresentava pequenos sinais e algumas características que chamavam a atenção. Até o primeiro psicodiagnóstico, apesar de eu já ter começado a estudar a respeito, logo após a consulta com a Neuropediatra, eu, meu esposo, e algumas pessoas da família, ainda não conseguíamos identificar no comportamento dele algumas características, como por exemplo nas habilidades de socialização pois, para nós, ele sempre foi muito sociável, simpático, carismático, gostava de crianças e brincava com elas, porém, a psicóloga avaliou que, na escola, ele não ia até as crianças para chamar para brincar e não interagia da mesma forma que as crianças na idade dele, a professora sempre pedia para algum amiguinho interagir com ele, ele aceitava e interagia, mas não por muito tempo, ou seja, havia sim uma redução na qualidade da interação que não víamos por estar em uma situação diferente da situação que ele vivenciava em casa. Outro ponto levantado por ela que nunca havíamos observado é que, na escola ele andou, algumas vezes na ponta dos pés. E foi abordando à partir destes pontos, que não tínhamos como saber, pois o comportamento se apresentou na escola, que a psicóloga me explicou o resultado do psicodiagnóstico e informou da possibilidade dele ser autista, digo da possibilidade porque só quem pode confirmar e fechar o diagnóstico é um Psiquiatra ou uma Neuropediatra qualificados para isto.
Saí do consultório sem chão, alguns podem achar exagerado, mas é exatamente essa a sensação, todos os que passam pelo mesmo processo descrevem da mesma forma, é realmente uma sensação de luto, pois o seu bebê, sua criança, idealizada já não existe mais, e você tem que lidar com um futuro incerto e desconhecido.
A primeira faze do luto é a negação, para nós essa fase já tinha começado antes do psicodiagnóstico pois, como informei, não sabíamos avaliar corretamente todos os aspectos de um autista e ficávamos tentando "justificar" algumas características como sendo o temperamento dele, por exemplo. Alguns argumentos que pais e familiares geralmente utilizam para negar a possibilidade de algum problema com a criança é que ela é tímida, puxou para algum parente que se comporta do mesmo jeito, cada criança tem seu tempo, fulano demorou pra isso, ciclano fazia isso também, etc., e isso faz com que muitos pais não busquem orientação de profissionais realmente habilitados e competentes para identificar, e se for o caso, iniciar um tratamento adequado e de preferência precoce. Muitos pais sentem até vergonha de contar sobre o diagnóstico para parentes e pessoas próximas, se sentindo culpados por terem fracassado. O maior risco na fase da negação, é que o quanto mais a família demorar para procurar orientação de profissionais mais haverá a demora em iniciar tratamentos adequados e garantir uma melhor qualidade de vida e no desenvolvimento da criança.
A segunda fase é a raiva, isso mesmo, raiva, começa o questionamento interno do porque está acontecendo isso, você começa a olhar seu passado e pensar se fez algo de errado que pudesse ter contribuído, pensa na genética da família para tentar encontrar um "culpado". Toda família quando quer ter uma criança, antes mesmo de engravidar já começa a idealizar, o sexo do bebê, cor do cabelo, dos olhos, se quer que pareça como pai, ou com a mãe, etc. e acima de tudo um bebê saudável e feliz, digno de um comercial de TV. Então quando as coisas não saem como o idealizado, a raiva é um sentimento bem possível nestas situações, que pode durar mais tempo ou menos tempo, até com maior ou menor intensidade. Caminhando junto com a raiva vem a tristeza, vergonha, culpa, medo, dúvida, incerteza, ansiedade, etc.
Durante o processo de aceitação do diagnóstico, com o objetivo de curar o sofrimento, muitos pais e familiares mergulham na busca de profissionais qualificados, brinquedos educativos, livros, artigos, vídeos na internet, etc., como forma de acelerar a "cura" ou "melhora" do filho, como se algo fosse fazer alguém dizer que o diagnóstico está equivocado. Alguns pais ficam tão inseguros que chegam a mudar algumas vezes os profissionais que estão atendendo ao seu filho achando que não está dando certo, ou pela incerteza de que aquele profissional realmente é qualificado para atender a questão atípica do seu filho.
Aí então vem a famosa, mas ainda desconhecida, a depressão, após o diagnóstico, conforme as coisas vão ficando mais claras, a percepção das dificuldades, características e diferenças do seu filho perante as outras crianças vai ficando cada vez mais evidente, há um sentimento de que as coisas não vão nunca mais ficar bem, existe muito medo do seu filho não ter uma vida feliz e funcional.
Os pais começam a ter que abrir mão de algumas coisas, por conta do tratamento do filho, financeiramente, socialmente, tempo, etc. Muitas destas coisas são difíceis de se adaptar, as vezes um dos pais acabam tendo que abrir mão também do emprego para se dedicar à estimulação do filho, para levar nas consultas, terapias, etc., mas fazem tudo que puderem para que seu filho se desenvolva. A depressão vem também por conta do sofrimento diante do julgamento das pessoas, ou da hipótese de julgamento, por abrir mão de algo que no primeiro momento não parecia que faria falta, mas depois faz muita, como o emprego, ou alguns tipos de lazer, pela falta de apoio do seus familiares, ou amigos próximos, o afastamento de algumas pessoas que não sabem entender a situação, então preferem se afastar, achando que estão ajudando ao te dar espaço.
E por fim a aceitação, existem poucos casos, porém existem, de pais que não chegam nesta fase, permanecem na negação. Aqui o sentimento é de que a luta poderá ser grande, mas vai ficar tudo bem, na medida do que for possível pois os resultados das terapias estão acontecendo, cada conquista nova é uma enorme comemoração, como as dos pais de bebês que comemoram quando o bebê senta, anda, fala, faz coisas que aos olhos dos pais é incrível, o bebê mais esperto do mundo. Essa fase é bem gostosa, até as coisas que eles ainda são diferentes tem um sabor diferente, de alegria, pois afinal você quer mais que seu filho seja feliz.
O que fica aqui de aprendizado, é que caso algum familiar, professor, cuidador, etc, levantar a hipótese de que em algum aspecto precisa ter um pouco mais de atenção, não fique apenas dando justificativas para negar a situação, não deixe de procurar um profissional para orientá-lo. A frase de que cada criança tem seu tempo é válida até determinado ponto, à partir deste ponto, negligenciar pode levar a prejuízos no desenvolvimento e aprendizado.
O processo de luto é normal e todos nós podemos passar por ela, o tempo de permanência em cada fase pode variar de pessoa para pessoa, assim como também a intensidade, mas o mais importante é você saber que não está sozinho (a), existem muitos profissionais apaixonados por trabalhar com crianças, jovens e adultos com necessidades especias, há muita informação boa na internet, muitos livros, pessoas com experiências pessoais ou profissionais para trocar experiências. Com muita perseverança, paciência e acima de tudo muito amor você vai conseguir lidar com a situação e dar o melhor que puder.
Finalizo com o meu carinho para todos que estão passando pelo luto referente a algum diagnóstico, e a certeza de que tudo passa, e ao aceitar a situação e seguir em frente, não negligenciando o tratamento, tudo vai se adaptando e é possível sim uma vida feliz, até maior do que se pode imaginar.
Gratidão
Vanessa Cristina Borato Mafra
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